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O Impacto do Narcotráfico no Futebol Colombiano:

  • Foto do escritor: Gandulas
    Gandulas
  • 2 de jul. de 2020
  • 7 min de leitura

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Andrés Escobar salta para cabecear a bola pela Seleção Colombiana ( foto de All Rise Films)

O ano é 1996, após nove anos, o América de Cali está mais uma vez de volta a final do torneio mais almejado do continente, totalizando a quarta vez em sua história, sendo a sétima vez em 18 anos que uma equipe colombiana chegava ao momento mais esperado para os amantes de futebol na América do Sul. Muitos se perguntam como a Colômbia passou de um país sem muita expressão continental para essa máquina de acumular finais, para isso, devemos voltar alguns anos, mais precisamente para os anos 70.

A “Chegada” do “Narcofútbol”:

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A equipe do Unión Magdalena da época (Divulgação: Unión Magdalena)

Caso você já esteja mais acostumado com futebol sul-americano, está ciente de que os principais clubes colombianos tiveram massiva ligação com o narcotráfico. Além deles, clubes de menor expressão atualmente, também tiveram esse apoio vindo de dinheiro ilícito, o qual inclusive, já acontecia como maneira de lavar dinheiro anteriormente, porém é na década de 70 que esse movimento começa.

Os irmãos Raúl, Pedro e Eduardo Dávila Armenta, famosos empresários e traficantes de maconha da cidade de Santa Marta, capital de Magdalena, deram o início ao movimento de união do tráfico com futebol. Tudo começou ao comprarem o time do Unión Magdalena, um time antes sem muitas aspirações, além de seu único título em 1968, e que atualmente está situado na segunda divisão colombiana, e levarem o clube a começar a disputar título com times maiores, principalmente no ano de 1979, aonde o time chegou a brigar pau a pau com os demais clubes, mas acabou o campeonato em nono lugar.

O clube teve sua queda de rendimento muito ligada à denúncia feita em 1983 por Rodrigo Lara Bonilla, que expôs diversos clubes com atividades muito ligadas ao narcotráfico, incluindo “El Ciclón Bananero”, como é conhecida a equipe de Santa Marta. Após essa situação, o governo colombiano ordenou à Superintendência de Sociedades exigir a contabilidade dos clubes para investigar possíveis fraudes. Depois desses fatos o esquadrão do Unión se manteve na primeira divisão até 1999, quando começou a acumular participações na B colombiana, tendo em 2019 subido novamente e, mais uma vez sendo fadado ao descenso.

O Primo “Pobre”:

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Equipe do Deportivo Pereira (Caracol Radio)

Sabe aquele clube que fica a maioria das vezes na Série A, mas sempre é coadjuvante? Pois é, com o Deportivo Pereira a história é essa. O clube acumulou em sua história bons campeonatos, mas nenhum título nacional, porém em sua ascensão na década de 80 teve papel fundamental no futebol colombiano, por um aspecto extracampo.

Octavio Piedrahita Tabares era o proprietário do clube, além de acionista do Atlético Nacional, e por quem os Estados Unidos pediram diversas vezes sua expedição. Foi sequestrado e liberado em 1986, porém dois anos depois não teve a mesma sorte e acabou assassinado em Medelín.

Piedrahita ficou famoso quando o Miami Herald, jornal de grande circulação em Miami, relatou que ele foi o encarregado por reunir os assassinos de Rodrigo Lara Bonilla, aquele mesmo, que denunciou como ministro da justiça os laços entre futebol e narcotráfico e duelou contra o dinheiro ilegal dos cartéis colombianos.

A Grama do Vizinho é Sempre Mais Verd(olaga):

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Torcida do Independiente Medellín

Imagine você, torcedor de uma cidade com dois times grandes, patrocinar seu time de coração e o seu maior rival, que curiosamente, só é hoje o maior time do país por conta desse apoio financeiro, essa era a vida de Pablo Escobar. Até 2015 acreditava-se que ele fosse torcedor do Atlético Nacional, um Verdolaga, mas era na verdade um Rojo, modo o qual são chamados os torcedores do Deportivo Independiente Medellín, como descrito por seu filho Juan em seu livro contando as histórias do pai.

O Cartel de Medellín financiou ativamente os 3 clubes mais próximos da cidade, os dois da capital da Antióquia, Medelín, e o Envigado, de uma cidade de apenas 10km da capital. Desde 1978, El Rey de Corazones, um dos vários apelidos do Independiente Medellin, teve seis presidentes ligados ao tráfico, juntos eles lavaram um total de 150 milhões de Pesos Colombianos, sendo que um desses mandatários, José Pablo Correa Ramos, foi assassinado a mando de outros mafiosos, de acordo com algumas fontes.

O Independiente Medellín foi também responsável pelo cancelamento do Campeonato Colombiano de 1989, pois, após um jogo com o América de Cali, o qual terminou 0x0, assassinos paisas, como são chamados os nascidos nessa região colombiana, mataram o assistente Álvaro Ortega a tiros, por ter anulado um gol que poderia auxiliar o DIM a ganhar um título nacional. Após o incidente, a FIFA e a Conmebol pressionaram a federação local a encerrar seu campeonato sem um campeão, algo que até hoje, aconteceu somente nessa situação.

O Mexicano e A Capital:

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Los Millonarios

Bogotá, como a bela cidade que é, sempre trouxe interesse alheio, e com o narcotráfico não poderia ser diferente. Após o período de sucesso dos Millonarios ter ficado no passado, o único recurso para sua volta ao futebol imponente com a equipe azul e branca foi com a chegada de Hermes Tamayo, que posteriormente foi morto. Com isso, o clube passou para um grupo de advogados, aonde Gonzalo Rodríguez Gacha, O Mexicano, sócio de Pablo Escobar, nos anos 1980, assassina um deles e torna-se dono de “Los Embajadores”, como são chamados os Millos, dado seu passado com conquistas internacionais.

O apoio fornecido por Gacha não era como um diretor de futebol, mas financeiro, permitindo ao clube conquistar sua 13ª estrela, algo que Los Azules desejavam há muitos anos. A conquista ocorreu em 1987, após um acirradíssimo campeonato de Apertura com o Atlético Nacional, sendo decidida na derradeira rodada do campeonato. Em 1988, o clube viria a repetir o feito com a conquista do Clausura.

O apoio do narcotráfico com a equipe quase trouxe mais consequências, quando em 2012, o presidente Felipe Gaitán, reconheceu que os campeonatos de 1987 e 88 somente foram alcançados graças ao dinheiro do tráfico de drogas. Ele estava analisando devolver os títulos, com a finalidade de retirar a imagem do clube bogotano de apoiador de atividades criminosas, porém essa ideia foi rechaçada por membros mais antigos da instituição.

Los Cardenales También se Ensucian:

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Independiente Santa Fé

Um clube marcado pela aproximação religiosa, tanto em seu nome, quanto em seu apelido, assim é o Independiente Santa Fé, que carrega a alcunha de Os Cardeais, porém esse traço santo do clube vermelho da capital é somente na parte de suas características. Inicialmente comprado por Fernando Carillo Valejo, vendedor de esmeraldas, narcotraficante e farmacêutico (inclusive utilizava sua rede de drogarias como fachada para refinar cocaína).

Posteriormente, a equipe foi adquirada por Phanor Arizabaleta, famoso narcotraficante do Cartel de Cali, que convocou Julio Alberto Lozano, o Patricia, do Cartel de Bogotá, como encarregado de lavar dinheiro. Juntamente com seu sócio, Daniel Barrera, o “Loco” Barrera, montaram uma operação de lavagem de ativos no Independiente Santa Fé. A rede de lavagem mantinha contatos com os irmãos Calle Serna, chamados de “Los Comba”, e o Cartel de Sinaloa no México.

Infelizmente, nos anos 2000 o clube também foi acusado de aliar-se ao narcotráfico, já que, Loco Barrera continuava a ter contato e influência junto à mesa diretora da instituição. O escândalo veio à tona em 2010, por meio de muita investigação policial com participação até de agentes estadunidenses, após a desconfiança dada à obstrução de justiça do presidente da equipe entre 2003 e 2007, Luis Eduardo Mendez, ao avisar a um narcotraficante colombiano que seria detido.

A Glória Verde Dependeu de Um Rojo:

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O Famoso Esquadrão do Atlético Nacional

Como já dito anteriormente, Pablo Escobar, famoso traficante colombiano e torcedor do Independiente Medellín transformou seu maior rival em uma potência, o Atlético Nacional, mas ele não foi o único a financiar o clube. Hernán Botero comprou o time para poder lavar seu dinheiro sujo, porém sua extradição aos EUA o impediu de continuar com a operação criminosa.

Após a prisão de Botero em 1984, o Atlético Nacional foi adquirido, agora sim, por Pablo Escobar. Debaixo das asas de Escobar, os Verdolagas tiveram seu auge do século passado em 1989, com o título da América. Essa conquista traz muita polêmica, principalmente após a denúncia do ex-presidente do Vasco, Eurico Miranda, de que o narcotraficante pressionava os juízes a errarem para o time colombiano.

O clube está atualmente em seu ápice, tendo empilhado títulos pelo país e conquistas continentais renomadas, como o bicampeonato da Libertadores em 2016. Caiu nas graças do público brasileiro por ter se comovido com o acidente da Chapecoense, em 2016, e abriu mão de jogar a final da Sul Americana, aceitando que o título fosse dado à equipe catarinense. Vale lembrar, a título de curiosidade, que caso a final tivesse ocorrido e o time de Medellín fosse consagrado campeão, se tornaria a primeira equipe sul-americana a conquistar os dois principais torneios continentais no mesmo ano.

O Que Vale Mais: Doar Sua Vida ao Diabo ou ao Narcotráfico? :

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A Constelação do América de Cali

Para os torcedores do América de Cali, a resposta para suas preces, não vem de Deus e sim do Diabo, o mascote do clube. Um dos maiores clubes da Colômbia, tendo colecionado títulos na década de 80 e 90 graças ao Cartel de Cali, liderado por Miguel Rodríguez Orejuela. Ao longo dos anos que teve apoio de narcotraficantes a equipe acumulou 8 títulos nacionais e 3 vices da Libertadores.

E é aqui que voltamos em nossa história:

Após as diversas lavagens de dinheiro de Orejuela, que uniu o clube à sua corporação (onde colocava 2600 funcionários, dos quais majoritariamente eram familiares ou empregados do América), a esquadra de Cali encontra-se mais uma vez na final mais importante para os “sudacas”, a Libertadores da América, porém o adversário da vez era o River Plate de Hernán Crespo. Novamente, o clube dos Diablos Rojos amargou um vice, totalizando 4 vices em 4 finais (o pior retrospecto em finais por quantidade).

No ano seguinte, as coisas mudaram para o América, e não foram para melhor, o clube foi adicionado na Lista Clinton, que os impedia de receber patrocínios, e adquiriu dívidas milionárias beirando a falência. A equipe acabou sendo rebaixada em 2011, pela primeira vez na história, e só conquistou a volta para a Primera A em 2016, onde se mantém no cotdiano, e é o atual campeão, voltando assim a uma Libertadores depois de 11 anos longe de seu sonho.


Menções Desonrosas:

Vale ser posto que clubes como, Deportes Tolima, aquele lá mesmo do Corinthians, e Deportivo Cali sofreram influências de organizações criminosas, porém desvencilharam-se de tais feitos e tem uma imagem mais limpa atualmente.


Apenas mais um fato:

Após o ano de 1996, apenas 3 finais tiveram a participação de equipes colombianas, em 1999, com o Deportivo Cali sendo vice e 2004 e 2016 com os títulos de Once Caldas e Atlético Nacional, respectivamente.

Fontes e Bibliografias:

Pablo Escobar y El Narco Fútbol Colombiano, Canal Memorias Del Futbol

PABLO ESCOBAR AND THE NARCO-FÚTBOL YEARS

Futebol e Narcotráfico ii: Uma breve análise da influência do cartel de Cali no futebol do América

Berkeley Review of Latin American Studies, Fall 2010

A impressionante e assustadora participação do narcotráfico no futebol sul americano

A perigosa relação entre o tráfico de drogas e o futebol

Na guerra do narcotráfico, entre mortos e feridos, sobreviveu o futebol colombiano

Alabarcés, Pablo (2 de abril de 2018). Historia mínima del futbol en América Latina. El Colegio de Mexico AC. ISBN 6076282711.

Mafia y fútbol colombiano, vieja relación

Polêmicas cercam passagem de Eurico Miranda pelo Vasco

 
 
 

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